Páginas

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Pequeno conto das duas e cinco da manhã

Desligou o telemóvel. Ainda agora acabara de lhe dizer que a amava e sentia-se na urgência de lho repetir. Resolveu-se por um suspiro. Amanhã, pensou. Amanhã é um novo dia, cheio de novas oportunidades. Amanhã volto a dizer que te amo, pensou. Fechou a luz. Voltou-se para o lado, fechou os olhos, imaginou-a ao lado dele e deixou-se vencer pelo sono.

As luzes dos candeeiros iluminam a rua,
A cidade parece deserta,
As pedras da calçada são minhas e tuas,
Eu amo-te
Sentamo-nos a fitar o céu vestido de negro
O brilho das estrelas confunde-se nos teus olhos
Foges de mim e pedes-me que te alcance
Eu ainda te amo
Busco a tua mão que teima em fintar-me
Enlaço os meus dedos nos teus dedos
Conto constelações nos teus lábios e beijo-te
Eu hei-de sempre amar-te

Acordou. Ao lado dele continuava o vazio deixado por ela. Pegou no telemóvel, viu as horas e deixou-se ficar a olhar o tecto. Quando saísse da cama começaria um novo dia cheio de novas possibilidades. Hoje voltaria a dizer que a amava. Hoje voltaria a ouvir a voz dela. Um novo recomeço para ambos. Bocejou, espreguiçou-se e finalmente decidiu levantar-se. Os pés  tocaram o chão frio. Hesitou um pouco, ganhou coragem: comecemos, pensou. Abriu a janela. As luzes dos candeeiros já não iluminavam a rua. A cidade vestia-se de gentes apressadas. As pedras da calçada eram de todos. Ele ainda a amava.

PedRodrigues



terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Amor obsessivo e compulsivo

Quando penso em ti, penso no português suave que os teus lábios gesticulam. Nas palavras que parecem sair numa língua estrangeira que as torna tão diferentes, mas tão belas. Sem dar por isso, perco-me a percorrer os meus lábios em busca dos beijos que deixaste perdidos. Suspiro  sete vezes. Percorro a casa e dou cinco voltas sobre mim mesmo até ficar tonto. Tenho o timbre da tua voz guardado em mim e ele guia-me mesmo quando as luzes se apagam. Sei que achas piada a toda a minha metodologia. Que chegas a corar quando grito ao mundo várias vezes – dez, para ser mais preciso – que te amo

-Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te.

Compreendo que retribuir o meu amor não seja fácil. As pessoas olham para mim como se fosse um louco, um lunático, um maluquinho. Apenas porque conto os carros pretos antes de atravessar a estrada; ou porque sinto necessidade de organizar a minha comida por cores; ou porque ligo e desligo o interruptor nove vezes. As pessoas olham-me de lado, julgam-me, mas tu não. Tu entendes esta minha loucura. Amas esta minha loucura. Tu percebeste que o mundo necessita de pessoas como eu. Pessoas que levem o amor ao extremo. Alguém que desafie as leis naturais das coisas. E tu achaste piada a todo este parque de diversões e não tiveste medo de entrar. Olhaste-me como nunca ninguém me olhou: de perto e sem medo. Percebeste que sou apenas uma pessoa assustada, com medo da solidão.

-Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te.

E é este meu amor obsessivo e compulsivo que nos vai unindo um ao outro. Por ti vou largando os velhos hábitos de procurar os germes que me sugam a pele. Por ti procuro um pouco de normalidade

-Amo-te. Amo-te. Amo-te

Por ti desligo a luz do candeeiro apenas uma vez. Vejo a tua imagem, decoro-a, apago a luz. No escuro consigo encontrar-te. Estás ao meu lado e as minhas mãos conseguem alcançar-te. Talvez ames a minha loucura por estares farta da normalidade. Entendo que seja difícil amar-me – por vezes nem eu me aguento.
Apetece-me beijar-te doze vezes. Permites-me? Apetece-me ouvir-te dizer, no teu português suave

-Amo-te, meu louco.

Podes dizer baixinho. Não há problema, eu oiço e respondo

-Eu também te amo. Eu também te amo. Eu também te amo.

Ou muito me engano ou o mundo precisa de pessoas como nós. Casais improváveis. Provas vivas de que o amor não se rege por nenhuma lei que não seja a lei do próprio amor. Nunca pensei, quando te olhava ao longe e te amava sem te dizer, que um dia partilharíamos a mesma cama. Contigo sinto-me amado e um pouco normal. Agradeço todos os dias esta obsessão e compulsão que sinto por ti

-Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te. Amo-te.


PedRodrigues

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Croniquinha do novo ano


Começou. Abre o peito às balas. Começou. Não tenhas medo. Avança. Sentes o coração a disparar? Sentes a adrenalina do não saber? Uma nova etapa, uma nova viagem, um novo recomeço, centenas de páginas em branco. Começou. Vai à luta. Delira um pouco. Ousa sonhar. Tens histórias para contar e outras tantas para escrever. Acredita em ti. Mete a mão no peito e sente o coração, tolo, descontrolado. Olha em frente. Lembra-te do passado, recorda os erros, recorda os ensinamentos, recorda os falhanços e as quedas, mas olha em frente. Olha o horizonte, estica a mão, agarra um punhado de ar, agarra outro e outro. Avança. Sem medo, avança. Pede beijos e carinhos. Sente a chuva gelada no rosto, a roupa molhada no corpo. Sente a chuva como se fizesse parte de ti, como se fossem apenas um. Olha o céu e deseja-o. Agarra um punhado de ar enquanto olhas o céu. Sente o sangue nas veias e o chão que pisas. Não é tão bom estar aqui? Não é tão bom fazer parte de algo tão belo? Sente a chuva e imagina o sol. Os dias quentes que acabarão por vir. Tudo vai e tudo vem. A vida é este ciclo vicioso. São as leis de Newton, de Avogadro, de Hooke, de Joule. São as tuas leis, as minhas leis, as nossas leis à mistura. Desacredita essa concepção ptolemaica de que o universo tem o centro no teu umbigo. Sê singular, mas pensa no plural. Diz não ao egoísmo. Acredita que fazes parte de algo maior que tu. Lembra-te da chuva. Recorda o sol. Funde-te com este mundo. Não tenhas medo de viver devagar. Dá tempo ao tempo. Acredita no poder das palavras. Na força de um olhar. Não tenhas medo de dizer. Não tenhas medo de sentir. Se caíres: levanta-te. Sente e faz sentir. Ama. Acredita no Amor. Vence etapas. Olha em frente. Escolhe viver. Ama mesmo. Ama como se deve amar. Faz alguém sorrir e vê o teu reflexo nesse sorriso. Começou. Estás com medo? É normal. Dá-me a mão. Começamos juntos. Olha para mim. Vês o brilho nos meus olhos? É esperança. Pede um desejo. Define objectivos. Não tenhas medo. Dá-me a mão. Palavra de honra que não a largo. Sentes o cheiro da terra molhada? Sentes a maresia? Consegues ver o horizonte? Já imaginaste o que estará para lá desse horizonte? Comecemos, sem medo. Dá-me a mão, sente a chuva gelada. Olha para mim. Não tenhas medo. Dá o primeiro passo e não tenhas medo. Acredita!

 

PedRodrigues