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quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Ensaio sobre o final de uma relação

Nas palavras dela, a culpa é minha. Porque depois do último adeus, do último beijo, me afastei. Diz que ainda me ama, ainda sonha comigo, ainda pensa, várias vezes, – demasiadas, segundo ela – em como seriam as nossas vidas se não nos tivéssemos separado. O que ela não compreende – e é isto que me irrita – é este sorriso e boa disposição com que disfarço as noites mal dormidas, as greves de fome, os soluços no peito sempre que vejo as fotos dela com as amigas a beber uns copos. Nas palavras dela, sou o vilão por ter esquecido tudo aquilo que passámos juntos. Por não a ter procurado quando ela mais precisava – e ela precisava sempre. Por sair à noite e não lhe dizer seja o que for. Esqueci-a. Fui eu que a esqueci e a desliguei num interruptor qualquer. Mas o que ela não entende é que apesar de sair com os meus amigos, não me esqueço dela. Quando bebo uns copos faço uma força imensa para não pegar no telemóvel e lhe dizer tudo o que sinto, todas as saudades que não consigo abafar por mais que tente. Não entende que preferia estar deitado com ela a ver um filme qualquer – não importa qual – e a fazer jogos de força com os pés em que nenhum de nós ganha ou perde. O que ela não entende é que durante todo este tempo, sempre que falava com ela, a convidava para vir ter comigo, mas ela não tinha tempo. Fazia-me de convidado para ir ter com ela, mas ela não tinha espaço. Acho que ela não me entende. Talvez eu não a entenda a ela, também. As coisas são como são, e por vezes os opostos atraem-se só para se destruírem um ao outro. Imagino que seja esta a lei fundamental das coisas. Não me vejo como um pobre coitado, que neste momento está sozinho na ressaca de uma relação. Assim como não me vejo como um vilão. O que não falta por aí são músicas sobre corações partidos, desgostos de amor e toda essa panóplia de flagelos amorosos. Mas a vida é mesmo assim: de tanto ouvirmos a mesma canção acabamos por nos fartar. Resta-nos apenas ter vontade de mudar e procurar uma canção diferente.
 
PedRodrigues

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Uma espécie de carta de amor


Não sei se isto é uma carta de amor, ou uma declaração de amor de algum género. Sei, porém, que te procuro todos os dias, na ânsia de te dizer o que sinto - que não é pouco. Vejo as tuas fotografias e atormenta-me não te falar, nada te dizer. Revolto-me com a minha cobardia. És a minha revolução – acredita – e ainda não te conheço, pouco sei sobre ti. Tenho vontade de te abraçar, de te dizer coisas que agora se aparentam presas na minha garganta. Sou um tipo estranho, confesso. Ainda não te conheço e já imagino cenários aleatórios contigo a meu lado. Num deles, estás com uma coroa de flores no cabelo, a sorrir – como naquela foto, sabes? – para mim. Era capaz de ficar horas parado a ver-te sorrir. Talvez seja mesmo amor, quem sabe? Ainda não te conheço e já te amo. Deve ser difícil aceitar isto, mas eu não cedo aos caprichos do socialmente correcto. Talvez te ame, não tenho vergonha de o dizer. E talvez tu leias isto e questiones a minha sanidade mental, mas eu tinha de o dizer. Porque amar-te em silêncio estava a deixar-me louco. Nestas coisas do amor, não chega imaginar. Sonhamos acordados com o que queremos que seja real. E a realidade, nua e crua, é que te quero ao meu lado a partilhar um café nessas chávenas em forma de coração, enquanto eu te digo coisas lamechas na esperança de um sorriso. Sim, esse sorriso, que me faz sonhar acordado.

Quando entrares, fecha a porta.

 

PedRodrigues

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

01:47

Descobres, devagar, que o mundo continua a girar, mesmo quando estás parado.

E isso assusta-te.

PedRodrigues

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Fala-me dos teus dias ao lado dela

São beijos no pescoço
Pequenos-almoços na cama
Ao Domingo de manhã
Carinhos em sítios aleatórios
Que arrepiam

 
São mais quinze minutos
Só mais quinze minutos
Antes de meter os pés no chão
Antes de regressar à rotina
São mais quinze minutos
Só mais quinze minutos
Junto a ti
(Podemos ficar aqui para sempre?)

 

São insónias partilhadas
às duas da manhã
As minhas ideias ridículas
As tuas gargalhadas estridentes
Enquanto a cidade dorme
E ninguém ousa fazer barulho

 

São coisas que ninguém sabe
E que guardo para mim
Como o quanto me amas
E o quanto te amo a ti.

 

 

PedRodrigues

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Partir, para ficar


Comecei, no dia um de Agosto, a escrever o meu segundo romance. Sou sempre um pouco céptico em relação ao que escrevo. Não é fácil meter no papel aquilo que trazemos por dentro. Não é fácil metermos as tripas de fora. Mas é necessário.
Aqui vos deixo um pequeno excerto. É assim que tudo começa.


Ali, o mar. Ali, o horizonte. Ali, as incertezas de uma vida que ninguém conhece, ninguém vê. O mar liga terras que não conhecemos, com pessoas que não conhecemos, com vidas que não conhecemos. O mar liga-nos.
 
As histórias começam onde as pessoas acabam. Há gente que acontece para lá daqui. Se gritar, mesmo que grite com todas as minhas forças, do outro lado do mundo ninguém me ouvirá. Sou demasiado pequeno para um mundo tão grande. As histórias são inventadas para serem passadas de boca em boca. Se tiver sorte, a minha história chegará ao outro lado do mundo. Os homens são demasiado pequenos para este mundo tão grande. Mas, de quando em vez, há homens que crescem e se multiplicam por todo o lado. Vão crescendo de boca em boca. O sonho dos homens é esse: serem gigantes.
 
Esta é uma história sobre pessoas e ideais. Uma história sobre concretos e abstractos.  
Tudo se passa numa pequena vila, junto ao mar, na margem sul de um rio que a separa de uma cidade média. Entre as duas margens há uma ponte. Há quem a atravesse para ir trabalhar, há quem a atravesse para regressar a casa. Esta é uma história de partidas e regressos.

PedRodrigues