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domingo, 20 de novembro de 2016

Texto triste, como esta noite de Inverno


Durante algum tempo acabei por dar luz verde à autocomiseração. Talvez porque achasse poder ter feito mais; ter dito mais; ter mudado um ou outro momento. Durante algum tempo carreguei às costas uma culpa demasiado pesada para ser só minha. Foram precisas muitas noites mal dormidas, muitos copos entornados, muitas refeições desperdiçadas, muitas músicas melancólicas ouvidas, muitas lágrimas choradas - à socapa. Durante muito tempo achei que o caminho devia ter sido feito por mim, ou melhor, que o desvio que levou à ruína foi tomado apenas por mim. Talvez este tenha sido um exercício de egoísmo. Uma tentativa de centrar em mim um sistema que não era, de todo, apenas meu. Mas o tempo acabou por passar – passa sempre – e com ele algumas coisas que permaneciam no escuro começaram a aparecer. Percebi, se for para chorar que seja por alguém que valha a pena ser chorado. A vida não é assim tanto tempo. E correndo o risco de cair noutras palavras: os vinhos das melhores castas revelam-se com o tempo, os outros acabam por azedar. Não vou cair aqui no erro de mistificar o outro lado, tornando-o numa figura monstruosa, cruel. Acredito que um dia tenhamos sido uma tempestade perfeita. No entanto, ao longo do caminho acabámos por nos perder. Não que a culpa tenha sido de um ou de outro, porque as estradas que construímos também acabam por ser distâncias que nos afastam: cabe a cada uma das partes encontrar a outra a meio do caminho – o que só se faz avançando em conjunto.
Apesar de tudo, creio ser normal, algumas vezes, ainda procurar velhas imagens, na esperança de uma memória feliz, ou tentar encontrar alguma indicação de um novo rumo da tua parte. É triste, e acabo por cair no mesmo erro que me levou a começar este texto, mas creio ser normal, creio ser humano. Não lidamos bem com finais. É um dos nossos defeitos de fabrico. E eu considero-me um artigo defeituoso. Um artigo perfeitamente defeituoso.
 

PedRodrigues

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