Durante algum tempo acabei por
dar luz verde à autocomiseração. Talvez porque achasse poder ter feito mais;
ter dito mais; ter mudado um ou outro momento. Durante algum tempo carreguei às
costas uma culpa demasiado pesada para ser só minha. Foram precisas muitas
noites mal dormidas, muitos copos entornados, muitas refeições desperdiçadas,
muitas músicas melancólicas ouvidas, muitas lágrimas choradas - à socapa.
Durante muito tempo achei que o caminho devia ter sido feito por mim, ou melhor,
que o desvio que levou à ruína foi tomado apenas por mim. Talvez este tenha
sido um exercício de egoísmo. Uma tentativa de centrar em mim um sistema que
não era, de todo, apenas meu. Mas o tempo acabou por passar – passa sempre – e com
ele algumas coisas que permaneciam no escuro começaram a aparecer. Percebi, se
for para chorar que seja por alguém que valha a pena ser chorado. A vida não é
assim tanto tempo. E correndo o risco de cair noutras palavras: os vinhos das
melhores castas revelam-se com o tempo, os outros acabam por azedar. Não vou
cair aqui no erro de mistificar o outro lado, tornando-o numa figura
monstruosa, cruel. Acredito que um dia tenhamos sido uma tempestade perfeita.
No entanto, ao longo do caminho acabámos por nos perder. Não que a culpa tenha
sido de um ou de outro, porque as estradas que construímos também acabam por
ser distâncias que nos afastam: cabe a cada uma das partes encontrar a outra a
meio do caminho – o que só se faz avançando em conjunto.
Apesar de tudo, creio ser
normal, algumas vezes, ainda procurar velhas imagens, na esperança de uma
memória feliz, ou tentar encontrar alguma indicação de um novo rumo da tua
parte. É triste, e acabo por cair no mesmo erro que me levou a começar este
texto, mas creio ser normal, creio ser humano. Não lidamos bem com finais. É um
dos nossos defeitos de fabrico. E eu considero-me um artigo defeituoso. Um
artigo perfeitamente defeituoso.
PedRodrigues
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