Os chapéus de chuva escondem
rostos chateados, avançando sobre pernas apressadas. Há quem dance, com o
vento, imitando os ramos das árvores. As velhas amaldiçoam os motoristas dos
autocarros que, a custo, engolem os insultos e os horários, sem darem resposta.
O céu de chumbo parece demasiado pesado para continuar a ser céu, e por vezes
acaba por cair sobre as cabeças dos mais distraídos. Nos semáforos os carros
apitam, porque entre a origem e o destino há uma estrada demasiado longa. Nos
dias feios, as pessoas parecem não ligar à beleza da cidade. Desconfio que
nunca olharam bem o recorte fino das nuvens no horizonte do Tejo. Os jeitos
infantis dos pingos a caírem sobre as velhas estátuas. A beleza sórdida no
cheiro do asfalto oleoso molhado: um afrodisíaco citadino. Os quadros pintados
nos vidros espelhados dos edifícios, uma espécie de ode aos tons cinzentos dos
filmes antigos. As flores arrebitadas nos vasos das varandas ancestrais. Lisboa
é uma cidade bonita, mesmo nos dias feios. Só é preciso saber parar um pouco: respirar,
olhar, escutar. Esquecer, por segundos, a velocidade dos dias. A beleza nasce
da tempestade. E Lisboa nunca se destacou pela calmaria.
PedRodrigues
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