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domingo, 28 de agosto de 2016

Na viagem de táxi

No meio da viagem uma música melancólica no rádio, o orvalho matinal desfeito no para-brisas, todos os ingredientes necessários para uma cena de filme. À medida que o carro avançava lembrava-me de ti. Apetecia-me meter a cabeça de fora e gritar. Talvez as lágrimas teimassem em aparecer a qualquer momento: não sei se pelos copos entornados, ou se o amor bate mais forte pela madrugada – enquanto a cidade ainda dorme.
O senhor perguntou-me:
- Para onde deseja ir?
Apeteceu-me responder-lhe
- Para onde for feliz – mas não o fiz; até porque ele não tinha como saber a tua morada, ou que a nossa história se tinha perdido pelas esquinas do destino. Já era tarde, e o meu cérebro parecia não ter força, nem vontade, para calar o meu coração. Sentia-o a chamar o teu nome e a saudade do teu cheiro chegava-me como um espasmo sádico na boca do estômago. Não sei o que me custa mais: se repetir as imagens dos nossos melhores momentos, se imaginar-te sozinha imune às nossas memórias. Talvez me custe mais cair no esquecimento, até porque a queda é imensa e o corpo não é feito de esponja. Cortaste-me as asas, digo eu. Há muita coisa má no mundo, mas acredito que não haja nada como nos eclipsarmos no peito de quem gostamos. Quanto mais me imagino a desaparecer na tua vida, mais vontade tenho de pedir que me levem à tua porta, na esperança que a abras e possamos voltar a ser os putos felizes de outros tempos. Não há uma noite em que não recorde o teu sorriso e, acredita, sonho praticamente todos os dias com os teus beijos. Devo ser masoquista.
A viagem ia longa ou, àquela hora, tudo parecia passar mais devagar. Ao chegar a casa tomei um banho e tentei afogar os fantasmas que me atormentam e se passeiam desvairados nessas noites em que a bebida entornada não dilui a tua imagem, nem o que ainda sinto por ti. O passado é uma lágrima chorada, ou tocada numa música que teima em passar na rádio. É melhor mudar de estação.
- Já é tarde. Leve-me a casa, por favor.


PedRodrigues 

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