Não
sei onde começam tantas guerras. Não sei de onde vem tanta ganância. Não sei
porque gritam os soldados de arma em punho a apontar para o céu. Não sei porque
sorriem esses mesmos soldados. Corpos pelo chão. Mórbidos olhares de crianças
vazias. Sangue no meio da poeira e poeira no meio do sangue. Rajadas de metralhadoras
jubilosas: sedentas de um pouco mais da carne dos filhos que as mães choram.
Corpos pelo chão. Uma pilha putrefacta de causas perdidas. Porque lutavas tu?
Glória eterna, amor à pátria e ao teu Deus. Onde estás tu? No meio dos
cadáveres és só mais um, na tua pátria apenas quem te ama te recorda, será que
encontraste o teu Deus? A tua mãe chora-te pelo meio da multidão de soldados,
de joelhos, a pedir explicações ao céu. Estás aí? Chora-te pelo meio da alegria
dos teus camaradas. No meio do desfile vitorioso da tua nobre causa, os teus
filhos são estátuas. Petrificaram com o medo - enquanto os últimos disparos e
as últimas explosões faziam as últimas vítimas. A criança dentro deles também
morreu. Consegues vê-la? Não sei onde começam tantas guerras. Não sei que Deus
é este que tantos mata. Que conceito abstracto é este que vos tentam vender com
tanto sucesso. Que fórmula mágica é esta que tantos move. Não sei. Talvez os
teus filhos um dia saibam. Não estarás cá para lhes contar as histórias que te
contavam a ti. A tua mãe morrerá e não terá tempo para o fazer. A tua mulher
chorará ao pisar a mesquita. Não verterá lágrimas, mas chorará. Os teus filhos
estarão condenados a conhecer o teu Deus. O mesmo que te levou deles tão
precocemente. Irão um dia lutar noutra guerra qualquer em nome dessa fórmula
divina. Onde estarás tu para os proteger das balas? Que pai serás tu se não
conseguires proteger os teus filhos das balas? Serás a memória do pai que os abandonou
pela vida eterna. E se uma bala não os levar, serão eles no desfile pelas ruas
da cidade. De metralhadora em punho a disparar para o céu. A sorrir, enquanto
os corpos mutilados fazem montes nas valetas. A gritar pelo meio das lágrimas,
do suor, do sangue, do pó. Sempre de arma em punho e Deus na boca. A aplaudir
mais um tirano que chegará ao poder a vender o abstracto. Outro que procurará a
glória terrena, enquanto vende a vida eterna. Assim começam as guerras: quando
Deus é vendido para proveito dos homens. Assim choram as mães e as mulheres.
Assim nascem os filhos da guerra: no meio da ganância e da fé. Uma mistura tão
explosiva como um raide de uma bazuca. Onde estarás tu, quando te aperceberes
que deste a vida por uma fantasia? Nesse dia serás feito do mesmo pó onde hoje
jazes. Não estarás cá, mas serás a prova que há um demónio que Deus desperta
nos homens.
PedRodrigues
gostei :)
ResponderEliminarestou a seguir :D