Eram flores selvagens. Amores
perfeitos não nascem em vasos. São livres, como a brisa que ainda sopra no
verão da nossa infância. Nesse tempo em que tudo parecia mais simples. Onde
tudo parecia fácil, como fechar com força os olhos e imaginar outros lugares:
praias lindíssimas, lugares na lua, casas junto a quedas de água. E, hoje, tu
ao longe, como os amores perfeitos, tão selvagem, tão dona de ti, tão senhora
de todas as razões. Eu aqui, atrás do vidro da janela, a olhar-te a crescer, em
silêncio, com medo de te assustar, ou de provocar um vento que te leve. O amor
passa-nos depressa, como o queimar de um cigarro. Ficam as cinzas do que
noutros tempos ardeu. Não há chama que dure para sempre. Não há chama que dure
sem consumir outros elementos. Tu de um lado do vidro, eu do outro. As tuas
cores sem se misturarem com as minhas. O teu cheiro pelas almofadas e pelos
lençóis ainda amarrrotados de todas as batalhas de amor. Não há guerra que dure
para sempre. No campo, depois da guerra, nascem as flores, por entre as beatas.
Falaram-me de haver uma forma de atravessar o vidro sem me cortar. De um país
para lá do teu reflexo. A viagem é difícil. Talvez porque depois do adeus não há
jornadas fáceis, talvez porque as saudades se descuidem líquidas pelos olhos,
como um aguaceiro a anunciar outros começos. Lembrar-me-ei para sempre da
rebeldia selvagem com que fugias à prisão dos vasos. E eu que te queria a
crescer dentro de uma caixa, junto do meu coração. Eu que te queria, mas tu
não.
PedRodrigues
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