Quanto mais se amavam, mais se matavam.
Para eles, o amor era um veneno dado em doses pequenas. Iam-se matando lentamente, sem saberem. Quanto mais se beijavam, mais os seus corpos fraquejavam. Valerá o amor a morte? Tudo indicava que sim. Valerá a distância a vida? Seria a morte o último reduto a conquistarem? Tudo indicava que sim.
- De que vale uma vida sem ela?
- Nada, digo-te eu.
- Preferes morrer?
- Já te disse que a prefiro a ela.
- Não foi isso que perguntei…
- Sim, foi.
A morte é um verbo com muitas cores, ao contrário da ideia popular. A morte tem muitas caras, muitos corações, muitos verbos. A morte não é apenas a ausência de vida. Morremos também quando caímos no esquecimento de quem nos ama. A morte não é apenas uma pistola carregada, apontada à nossa cabeça. A morte é a falta daquele toque, daqueles beijos, das pregas daqueles lábios. É a ausência das texturas, dos meridianos contados na pele. A morte é uma espécie de molécula, como o oxigénio, que respiramos, mas não vemos e quando a tentamos agarrar: apenas o vazio. A morte é um vazio.
- Eras capaz de viver sem ele?
- Não.
- Mesmo sabendo que ele te pode matar?
- Ele é a minha última paragem.
- Não pensas continuar?
- Não.
O amor, por si só, não encurta distâncias; não conquista fronteiras; não começa guerras. O amor é um substantivo, muito usado pelos poetas e outras pessoas malucas. O amor é o dono do hospício onde todos julgamos dançar em silêncio. O amor. O amor. O amor. Dizem-nos de ele ser uma palavra no dicionário e pintada nas paredes das cidades. Dizem de ele ser uma fotografia de um abraço, com um pôr-do-sol muito bonito no fundo. O amor deve ser uma força: sem ser massa por aceleração, ou sim: dois corações que aceleram e se atraem um ao outro. Uma frequência bonita. Uma melodia assobiada pelos dias. Um sorriso. O amor deve ser um sorriso. Ou a causa da morte de alguém.
- Morrias por amor?
- Morremos todos os dias.
- Não foi isso que perguntei.
- Tens de rever as tuas perguntas. São bastante monótonas.
- Só queria saber se morrias por amor.
-Todos amamos alguma coisa. Viver é morrer, todos os dias, um bocadinho. Faz as contas.
Quanto mais se amavam, mais se matavam. No início era o verbo. No final, também.
PedRodrigues
Sem comentários:
Enviar um comentário