Lembro-me da primeira vez que
te vi realmente: vestida de negro e iluminada por uma lua enorme cor de pérola.
Senti uma certa vertigem cá dentro, um orgulho imenso que ainda hoje não
consigo explicar. Nesse momento percebi o verdadeiro porquê das baladas, do
choro das guitarras. Observei a disposição de cada edifício; a universidade lá
no alto; a cabra a guardar cada canto, cada pedra. Senti-me em casa, no
verdadeiro sentido da palavra casa. Como se fosses uma extensão física de mim.
Uma necessidade lógica de viver para lá do meu corpo.
Desde esse dia até hoje,
passaram-se anos. O tempo é inevitável. Passa por nós e vai-nos transformando
aos poucos. Mas há coisas que ficam marcadas por dentro. Coisas que guardamos
de forma a que sejam eternamente nossas. De ti guardo todos os momentos que me
trouxeram até aqui. Os joelhos esfolados das quedas que me foram tornando mais
forte. As conversas partilhadas entre os amigos que me apresentaste e que
guardarei para a vida. As gargalhadas e as bebedeiras dessa juventude sónica
que parece ter passado a correr. Os primeiros sorrisos dos amores começados à
beira rio; as últimas lágrimas choradas em bancos de jardim por esses mesmos
amores. De ti guardo esse ponto cardeal que será para sempre a minha juventude.
O porto de abrigo necessário que continuarei a procurar e a recordar ao longo
da vida. Guardo essa ténue linha que separa essa mesma juventude da idade
adulta. A metamorfose de quem entra menino e sai homem. Guardo de ti essa
saudade dos passeios nas tardes de primavera. O calor infernal das tardes de
Junho. A beleza das tuas entranhas feitas de pedras históricas e conhecimento.
A alegria dos cortejos de caloiros e finalistas. Guardo de ti as músicas
cantadas em uníssono de copo na mão. A capa negra que me lembrará para sempre
dessa primeira noite em que te vi com olhos de gente; a mesma capa que um dia
vesti com tanto orgulho.
Ficará muito por dizer. O
silêncio guarda as melhores palavras, as melhores histórias.
Dizer adeus a algo - ou alguém
- que amamos será sempre doloroso. Deixar para trás o que conhecemos, o que faz
parte de nós, exige um esforço sobrenatural. Mas tudo tem o seu tempo. Nada é
para sempre. Chegámos ao fim da canção. É hora de partir com a certeza desse
passado. Com a certeza desse futuro que
começou em ti. Do mais fundo de mim, agradeço-te por tudo. Por me teres
acolhido e moldado à tua imagem.
Obrigado, Coimbra. Esta
lágrima que choro, é feita de ti.
PedRodrigues
Palavras que podiam ser minhas, soubesse eu escrever assim!!
ResponderEliminarQuerida cidade.
O que eu quisera dizer há muito e não consegui. Parabéns ao autor pelo texto.
ResponderEliminarCoimbra é isto....
ResponderEliminarEsta cidade, que me viu nascer, crescer tem esta capacidade de nos fazer tão felizes. Texto maravilhoso
Só quem vive a verdadeira essência de Coimbra sente e vive estas palavras
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