No início
vi-te como uma prisão. Afastavas-me de tudo o que mais gostava. Eras a
personificação de todos os males. Julgava-te causadora de infelicidades
extremas e cólicas de saudades. Amaldiçoava o dia em que era obrigado a
retornar aos teus braços e, ao chegar, contava os segundos que faltavam para partir.
De certa forma, fazias-me sentir deslocado. Obrigavas-me a crescer todos os dias.
Agora, a mãe não estava para me fazer o almoço, ou o jantar; o pó não
desaparecia por magia e acumulava-se a uma velocidade vertiginosa; as
constipações pareciam operações ao apêndice e, só o ligeiro pensamento de uma
operação desse género, era sinónimo de noites e noites de insónias. Fizeste de
mim homem e, se queres que te seja sincero, não sei quando é que tudo mudou
entre nós. Hoje sinto-nos numa sintonia perfeita. A verdade é que cresceste em
mim, e eu cresci contigo. A verdade é que és um casulo onde entramos meninos e
saímos homens.
Custa-me
ouvir-te falada nas bocas dos outros como uma cidade de tradições obsoletas.
Como um conjunto de regras disfarçadas de rituais que vêm passando de geração
em geração. Para mim, tradição nunca foi sinónimo de códigos ou condutas.
Sempre foi sinónimo de tudo o resto. Não me interpretes de forma errada: é com
o maior orgulho que uso as tuas vestes. Mas, sinceramente, arrepia-me da mesma
forma a tua imagem ao luar sobre o Mondego. Acredita quando te digo que o sol
de Coimbra é diferente do sol do resto do mundo. É o único sol que me causa um
sorvedouro miudinho nas veias, como se o sangue corresse ao contrário quando me
sento numa esplanada a admirar as tuas árvores, a tua calçada, ou a disposição
de todos os teus edifícios. Nem o musgo, que se vai multiplicando com o tempo
nas tuas paredes, me deixa indiferente. Sinto tudo isso. Sinto como se todos os
dias fossem o último, e a saudade - que nos obrigas a aprender - estivesse ao
virar da esquina. Aprendi a admirar-te porque, para o bem ou para o mal, comecei a sentir-te como uma extensão de mim. E faltam-me as palavras para
descrever o orgulho que é ouvir-te cantada nas tuas entranhas históricas. És
cidade de homens e mulheres em corpos de meninos. Quer queiramos, quer não,
fazemos parte da tua mais refinada elite. Acredito que choras um Mondego de
lágrimas quando fracassamos. Da mesma forma que o teu coração de pedras
ancestrais se contrai de orgulho com os nossos sucessos. Um dia hei-de poder agradecer-te
por tudo. Dificilmente conseguirei ser justo. Agradecer-te por tudo será sempre
uma tarefa hercúlea. Agradeço-te, sobretudo, por me teres dado uma breve
introdução ao amor. Por me teres apresentado um leque tão vasto de amores de
bolso e me teres ensinado a amar de corpo inteiro e tripas de fora. Se hoje
consigo amar como gente crescida a ti te devo. Obrigado.
Serás
sempre recordada por nós como a ponte entre a nossa meninez e a idade adulta.
Tenho pena de quem não teve o prazer de te conhecer. E tenho mais pena ainda de
quem te conheceu, mas não soube amar-te. Assim sendo, este é o conselho que
deixo a quem entra nas tuas portas: vivam como se acabasse amanhã, sintam como
se fosse para sempre.
PedRodrigues
*---* Irei embora só daqui 1 ano e 5 meses, mas já choro de saudade!!!!!!
ResponderEliminare eu que irei a daqui exatos 3 meses *--*
Eliminar"Mas, sinceramente, arrepia-me da mesma forma a tua imagem ao luar sobre o Mondego. Acredita quando te digo que o sol de Coimbra é diferente do sol do resto do mundo."
ResponderEliminarObrigada : )
Sublinho inteiramente as tuas palavras.
ResponderEliminarObrigada pelo momento.
Como eu me revejo nas tuas palavras. Coimbra estará sempre no meu coração.
ResponderEliminarPG
há coisas que só quem estudou e viveu em Coimbra percebe...
ResponderEliminarposso levar um excerto deste texto para o meu blogue (com os devidos créditos, claro)?
Parabéns! Para além de muito bem escrito, diz tudo! Obrigado Coimbra!
ResponderEliminarÉ uma bela forma de explicar este amor que tantos sentimos... eu gostei muito.
ResponderEliminarMuito bonito :)
ResponderEliminarA melhor, a mais exacta, a mais bela descrição de sempre!! Parabéns, fantástico!
ResponderEliminarNasci, cresci e vivi Coimbra até ter de ir trabalhar para outra cidade.
ResponderEliminarQuando lá volto, o aperto no estômago é sempre o mesmo. É ali o meu canto, as minhas gentes, as minhas ruas. Já passaram quase 4 anos desde que a deixei e o sentimento é o mesmo.
Obrigada pelas palavras magníficas desta minha, tua e nossa cidade.
Excelente texto! Parabéns!
ResponderEliminarEstou, pela primeira vez, a viver a experiência de ser estudante de uma outra cidade.De uma outra academia. De um outro sítio que não aquele que me viu nascer e crescer durante 22 anos.
ResponderEliminarAinda recordo o último adeus, a olhar a Cabra onde a Capa aos ombros nunca me tinha parecido tão pesada.
Como se me quisesse manter ali, a Baixa de Coimbra parecia enevoar-se no meio das minhas lágrimas.
Mas quando acordei, nem o maior desejo de que tudo fosse irreal me livrou. Foi hora de partir. Foi hora de largar. Foi hora de sentir que a menina agora tinha de se tornar Mulher.
Obrigada por estas palavras, que tão bem me arrepiaram ao mesmo tempo que me confortaram!
http://falsosabsurdos.blogspot.com
"Tenho pena de quem não teve o prazer de te conhecer. E tenho mais pena ainda de quem te conheceu, mas não soube amar-te."
ResponderEliminarSentir todos sentimos, mas só sabe o seu verdadeiro significado quem lhe dá o devido valor. Esta cidade que tanta história contém, faz com que muitos carreguem aos ombros a construção de um ser, de um futuro. Aqueles que não se entregam de corpo e alma nunca a saberão amar. Podem falar dela, contar as suas histórias, brindar aos seus encantos... mas tudo tem um tempo certo de "findar". Coimbra será sempre uma saudade vigorosa, mas é essa mesma saudade que nos fará sempre regressar.
Sem duvida, um excelente texto. Muitos Parabéns ! :)
Simplesmente maravilhoso... Parabéns e Obrigada!*
ResponderEliminarNão conseguiria exprimi-lo melhor...e confesso que houve lágrimas escondidas ao lê-lo...como aquelas que se mostravam no Choupal ou no desabafo enebriado duma noite entre amigos, daqueles amigos que temos a vida toda, que saíram da faculdade para entrarem nas nossas vidas como um prolongamento delas...e da Coimbra que vive em todos nós! Obrigada Pedro!!
ResponderEliminarBom, eu saí há 26 anos mas o que sinto por Coimbra nao é igual ao que sentia ha um ano, ha quinze anos ou há vinte nos. É mais forte. E cada ano que passa, torna-se mais forte. Embora vivendo no estrangeiro, (tambem fui do "estarngeiro" Cabo Verde), ainda hoje, tudo à minha volta é relacionado com Coimbra. E todos que convivem comigo (os estrangeiros) sabem de Coimbra. O que o Pedro Rodrigues descreveu, foi exactamente o que acontceu comigo, ... ou seja nao foi amor a primeira vista. Nao, nao nao, longe disso.
ResponderEliminarHelder Mendes
Este texto diz muita coisa.. De entre muitas coisas, tb tenho mta pena daqueles que por Coimbra passaram e não a conseguiram apreciar.. só eu sei as saudades que esta cidade, pessoas e suas vivências me deixam.. Por isso reafirmo "vivam como se acabasse amanhã, sintam como se fosse para sempre". Só um verdadeiro estudante de Coimbra poderia escrever semelhante conteúdo tão sentido :')
ResponderEliminarParabéns:) Muito bem escrito. Estudar em Coimbra não se explica sente-se :)
ResponderEliminar"Acredita quando te digo que o sol de Coimbra é diferente do sol do resto do mundo."
ResponderEliminarCoimbra é sem dúvida uma Cidade maravilhosa! Emigrei há 9 anos, mas Coimbra continua com os mesmos encantos. Os anos passam, mas Coimbra continua a ser a Cidade de eleição! E é acima de tudo quando estamos longe que aprendemos a valorizar verdadeiramente o valor desta belíssima Cidade! O teu texto está fantástico, muito bem escrito. Parabéns!
Excelente texto! principalmente para quem, como eu, está em Coimbra já na fase final do curso, recorda-se muita coisa!
ResponderEliminar**
HF
http://the-hf-blog.blogspot.pt/
E permaneço aqui, acompanhada pelas mesmas sinfonias de sempre, pela mesma paisagem que me alegra a vida, respiro o mesmo ar mas com uma impertinente sensação de que tudo mudou, a vida que me corre agora nas veias não tem mais aquele sentido confuso, sinto agora cada momento como se fosse meu, e como é meu…
ResponderEliminarA cada segundo me apercebo mais que cheguei onde queria, encontrei o meu lugar, compreendi, agora, de como quero viver a minha vida. Os segundos que contava antes eram ridiculamente insignificantes pois, de verdade, não tinha a noção de onde pertencia, do que queria. Agora, aqui, em mais uma das minhas muitas viagens comigo mesma, revejo a minha vida em fragmentos e percebo que só agora sou plenamente eu, sim, vou para onde quero ir, lá esperam-me as pessoas que quero ter a meu lado para o resto da minha vida, as alegrias e as lágrimas que vão acompanhar-me na memória por todos os momentos.
Lá, no meu lugar, reside o melhor e o pior de mim, reside a dor, a lágrima, o sorriso forçado assim como a gargalhada, a alegria que me preenche, a verdadeira felicidade. Amo este meu lugar, amo com todo o meu ser, Amo-te Coimbra!*
É sempre bom ver sentimento com os quais nos identificamos tanto posto em papel, para a eternidade. Obrigada!
Que homenagem fantástica a Coimbra, melhor dito é impossível. Entrei na cidade há nem um ano e sinto que toda a viva vivi lá, que é lá que pertencem o meu corpo e a minha alma. Obrigado Coimbra (:
ResponderEliminarSe hoje consigo amar como gente crescida a ti te devo. Obrigado.
ResponderEliminar...parabens pelo texto! Eu nao o faria melhor!
Fantástico texto! Agradeço a Coimbra tudo o que tem sido comigo e para mim mas agradeço-te também, Pedro, pelo maravilhoso retrato dessa cidade linda!
ResponderEliminar"Mas, sinceramente, arrepia-me da mesma forma a tua imagem ao luar sobre o Mondego. Acredita quando te digo que o sol de Coimbra é diferente do sol do resto do mundo."
ResponderEliminarQue homenagem!Se Coimbra fosse uma mulher casaria-se contigo Pedro!
Bem haja,porque a amaste!
Sinto parte daquilo que escreves. Obrigada pelo momento.
ResponderEliminarexcelente escrita. belos tempos, amizades e recordações que essa bela cidade marca em tanta gente que por aí passa...
ResponderEliminarpara todos os que sentem a grande dimensão e peso da palavra "Saudade": http://youtu.be/f3WGttZdksg
aproveitem tudo o que essa cidade transmite e ensina. é grande, é linda, é Coimbra...
Deixei Coimbra em Julho do ano passado. Hoje, mais do que nalgum dia desde deixei Coimbra para trás, senti uma saudade profunda dessa cidade que me viu crescer. Posso dizer que os 3 anos que lá passei foram os mais felizes da minha vida, que cresci e me tornei na mulher que sou hoje sem quase ter dado por isso. Como diz a Balada da Despedida de Economia, "Em ti sofri / Bebi, amei e ri.". Nada exprime, em apenas 6 palavras tão bem o que sinto. À excepção deste texto, que me deixa os olhos rasos de lágrimas de cada vez que o leio. Não basta visitar Coimbra para a conhecer: é preciso envolver todos os sentidos e, sobretudo, abrir o coração. Só assim se pode absorver tudo aquilo que Ela nos diz, nos ensina. É tudo isso que nos torna seres humanos, é isso que nos torna adultos. Por muitos amores que se tenham na vida... Coimbra será sempre aquele que sabemos que nunca nos deixará. <3
ResponderEliminarObrigada Pedro, por personificares em palavras tao acertadas e cobertas de simbolismo, o Estudante e ex estudante de Coimbra. Já deixei Coimbra á um ano e o sentimento nao morre e nao morrerá nunca! Fantástico!
ResponderEliminarFantástico! :)
ResponderEliminarObrigada, por cada palavra se encaixar de modo perfeito no meu sentimento por esta cidade
ResponderEliminarParabéns :)
DM
"Tenho pena de quem não teve o prazer de te conhecer. E tenho mais pena ainda de quem te conheceu"
ResponderEliminarParabéns e continua vou ficar atenta é lindo o que escreves.
Das mais belas descrições do que é ser Coimbra, do que é viver Coimbra, respirar Coimbra, amar Coimbra.
ResponderEliminarNasci em Coimbra e este texto reflecte exactamente aquilo que sinto por esta cidade.
Muito obrigado por este texto brilhante.
Coimbra estará sempre de braços abertos para ti!
"Como é que descobriu os sentimentos de todos os conimbricenses! Fantástico texto.
ResponderEliminar"...Quem não te vê anda cego...que te não ama não sente"
acho que são assim os versos que o Zé Afonso cantou.
Muito bem. parabéns!
ResponderEliminarestou com as lágrimas nos olhos... grande texto...
ResponderEliminarAmei Coimbra desde o dia Um. Obrigada por todas as palavras que escreveste e que eu nunca escrevi. É tudo isso (menos o início da prisão). É tudo isso, para sempre, dentro daquilo que somos e seremos.
ResponderEliminarEste vai do meu blogue (Deste Lado da Rua)
Quinta-feira, 21 de Outubro de 2010
Tempos
Sou do tempo em que se partilhavam cigarros e éramos felizes assim. Sou do tempo em que se dizia: “Amo-te para sempre” e todos sabíamos que não podia ser para sempre. Mas prometíamos. Não concebíamos outra espécie de amor. Sou do tempo das serenatas e das drogas leves e pesadas. Da mão que ergue a outra mão, que não julga. Sou do tempo em que se experimentava tudo: dormir ao relento, trair, ser traído, chorar uma semana inteira, prometer atravessar um oceano só para o ver. Sou do tempo em que um amor podia durar apenas uma semana mas ficava marcado a vincos no coração. E aquela pessoa nunca se destruía ao nosso olhar. Sou do tempo em que os planos de futuro eram todos bons ou uma treta, dependendo da qualidade do vinho que se estivesse a beber. Era tão longe o futuro. Éramos tão felizes. Todos. Um por um.
Agora, não sou de tempo algum. Talvez alguém tenha descoberto alguma coisa que eu ainda não descobri. Talvez se tenham já todos habituado. À perda, à desilusão, ao desencanto. Mas como, como, como? Dou por mim a olhar nos olhos de quem foi de um tempo que eu não sei, a ver se deslindo, a ver se me encontro, a ver se dou com alguma outra coisa igual à minha. Mas não. Ainda guardo esta eterna revolta que não consinto que descambe em melancolia. Podia ser cansaço. Não é. Eu, simplesmente, não vos compreendo.
Publicada por PFF em 21:56 1 comentário:
Tens de lhe dizer que é para sempre. Ainda não percebeste tudo.
ResponderEliminar- Estúpido.
:)
extraordinário!
ResponderEliminarComo entendo!!!!
ResponderEliminarParece que encontrei o texto que nunca consegui expressar!! :')
Obrigada Pedro Rodrigues :)
Vivi em Coimbra por apenas 7 meses, em 2006/2007, mas até hoje sinto falta desse lugar. Realmente foram os meses mais intensos de minha vida, de amadurecimento, aprendizado, saudades, amores e auto-conhecimento.
ResponderEliminarAo ler esse texto me emocionei, pois imagino o que é passar anos nessa cidade e depois ter que deixá-la...
Bravíssimo, Predo Rodrigues!
Obrigada Pedro, tudo o que em cima está escrito parece que saiu do meu pensamento. Arrepio-me quando leio, é mesmo o que eu sinto.
ResponderEliminarOBRIGADA
Que saudades da cidade que eu considero a minha casa! Obrigada Pedro pelo texto magnífico, por cada palavra ... Simplesmente adorei! :)
ResponderEliminarCoimbra não se explica, Coimbra sente-se, vive-se.
ResponderEliminarÉ um sol diferente, um ar diferente. Para mim, é a materialização da liberdade. É o ponto de encontro, mais do que com amigos, comigo própria. Coimbra é a fúria do mar e a calma do campo, é a realização de uma montanha acabada de escalar e a busca constante por montanhas mais altas, é a liberdade e o refúgio, a busca e o encontro. É um lar, será sempre.
É como encontrar a tua alma gémea, em versão cidade.
Olá Pedro! Adorei o teu texto! Sinto que Coimbra me fez crescer à força mas que a vida é assim e hoje também lhe agradeço por isso. Vou fazer 10 anos de curso e vou, juntamente com outros colegas e amigos, organizar um almoço de reencontro dos 180 alunos do curso. Queria saber se poderia ler o teu texto nesse dia? Referindo o autor claro...Acho que seria belíssimo.
ResponderEliminarEste texto arrepiou-me. Foi,sem dúvida alguma dos melhores textos que já li sobre Coimbra. É importante existirem pessoas que tentam descrever aquilo que não é possível ser descrito. Obrigada pelo que li!
ResponderEliminarTexto fantastico e que faz todo o sentido............. já vivi em Coimbra varias vezes depois de ter estudado, porque procuro sempre uma oportunidade de lá viver (terminei curso em 1983). Mas por razoes profissionais acabo sempre por ir para outro lado (saí novamente em 2012)... Só espero é ter novamente oportunidade de voltar. Essa cidade entranha-se na pele da gente e infiltra-se até aos ossos.... é uma maldiçao de certa forma. Fica-se amarrado e até lamechas... vieram-me lagrimas aos olhos com esse texto.
ResponderEliminarMas nao desisti, ainda voltarei a viver em Coimbra.
Que texto feliz!
ResponderEliminarApós ter vivido em Coimbra entre 2009/10, senti-me retornando àquele recanto de tão agradáveis recordações.
Parabéns Pedro!
Intemporal está texto. Parabéns
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