O
dia em que parti foi um dos dias mais difíceis da minha vida. Ainda te consigo
ouvir
-Não
vás
A
soluçar entre as lágrimas enquanto me vias entrar no táxi. Se imaginar com
muita força, ainda consigo sentir o calor da tua pele, ou o cheiro do teu
colarinho. Deixar-te para trás foi a decisão mais difícil que tive de tomar,
mas era a única decisão possível. Conhecemo-nos num tempo em que tudo era mais
fácil. Foram três anos de bonança. Três anos de despreocupação. Existias tu, os
livros, as bebedeiras, os amigos, as viagens. Nada nos faltava e tudo nos era
dado de mão beijada. Dividíamos o tempo entre sorrisos, carícias, a Torre
Eiffel, o Big Ben, o Coliseu de Roma, uma ou outra discussão, fotografias e
mais fotografias e nessas fotografias mais sorrisos e mais carícias. A vida
parecia tão simples naquele tempo.
Quando
terminámos o curso, ambos achávamos ter destruído um monstro. Terminámos de
sorriso no rosto e sensação de dever cumprido. Dali para a frente seria sempre
a subir: eu iria começar por baixo numa empresa, mas em poucos anos chegaria ao
topo; tu abririas o teu próprio consultório e atenderias centenas de pessoas
por ano. Naquele tempo o céu era o limite. Lançámo-nos aos lobos, entrevista
atrás de entrevista, mas as coisas teimavam em não acontecer. Nunca
desesperámos
-Pensamento
positivo
Nunca
baixámos os braços. Na televisão os governantes mandavam-nos emigrar, mas nós
nunca o faríamos. Deixar para trás tudo aquilo que conhecemos? Depois havia a
questão dos teus pais
-A
minha menina
Que
se contorciam só de nos ouvir falar em ir trabalhar para fora. A tua mãe que
entretanto tinha descoberto aquele caroço num seio. Toda uma panóplia situações
que nos prendiam às nossas raízes. Deixar para trás o meu país? Deixar para
trás aqueles que amo?
-Nunca
Continuámos
juntos no meio de toda aquela tempestade. Creio que se não fosses tu, teria saltado
na primeira oportunidade. Mas amava-te, como ainda hoje te amo. E é difícil.
Aliás, é cruel abandonar quem se ama. Dói, dói muito. Não imaginas como me
sinto de cada vez que vejo as nossas fotografias – juntos e felizes - ou de cada vez que falo contigo por telefone.
Sinto aquela parte de mim, que outrora trazia todos os sonhos do mundo na
algibeira, a morrer. Sinto-me a forçar os sorrisos e não imaginas o esforço que
faço para manter a calma e não me desfazer em prantos desmedidos. Amar em tempo
de crise é algo que roça o sadismo. Um dia sonhei casar contigo, mas um dia
esse sonho foi-me roubado. Quem foram os sacanas que nos condenaram a este
destino? Quem foram os crápulas que nos pisaram os sonhos? Um dia julgámos que
a vida era a direito. Hoje podemos ver que não é. No entanto uma coisa te
garanto:
-Não
desisto
Não
desisto de nós. Não desisto dos nossos sonhos. Enquanto tiver saúde e enquanto
tiver trabalho
-Não
desisto
Espero
que desse lado do oceano faças o mesmo. Não baixes os braços, levanta a cabeça.
Daqui a uns meses voltaremos a estar juntos. Quem sabe se daqui a uns anos não
chegaremos mesmo a casar? O mundo está em crise é um facto. A vida está difícil
é um facto. Mas quem ama na tempestade, não esquece na bonança. Não desistas de
ser feliz.
PedRodrigues
A Cidade dos Amores é improvável e única.
ResponderEliminarA mim trouxe-me um amor, fugiu-me dos pés (a cidade) mas o Amor surgiu com sucesso.
Casada.
Emigrados no mesmo país com 7 meses de dor de distância.
Jamais desistir de ser Feliz e sempre, mas Sempre, seguir os instintos.
Disso é feita a história de Pedro e Inês.
Adorei, como sempre adoro os teus textos e a tua forma de escrita.
ResponderEliminarOs teus textos exprimem o que alguns de nós sentem em determinados momentos da nossa vida. Este texto particularmente reflecte os sentimentos numa época em que somos obrigados a deixar o nosso país e a nossa familia em busca de emprego.
Foi a primeira vez que um texto me fez chorar. É das coisas mais lindas que já li.
ResponderEliminarQue surpresa boa o teu blog! Conheci-o por acaso, a partir de um post no Facebook e gostei do texto, não só por o considerar muito bem escrito, mas sobretudo pela carga e sentimentalidade que transmite. Não resisti a navegar por este Mondego adentro. É que na minha terra, também há um rio assim...
ResponderEliminarAlém do que está escrito ser fantástico, consegues passar o que te vai no coração e na alma para quem está a ler deste lado! Parabéns e força para essa luta que é amar em tempos de crise!
ResponderEliminar