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quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Ensaio sobre o absurdo


A única luta que trago, a única luta que me permito és tu. O meu quarto ainda tem os contornos do teu corpo nas paredes. Eu sei: parece absurdo. Como poderia a carne moldar o betão duro? Não me perguntes os enigmas da vontade. Não me perguntes os porquês das coisas que não têm explicação. Aceita-as por serem como são e não por aquilo que supostamente deviam ser. A vida é feita de vontades. A minha vontade é feita de vontades. Quase consigo respirar-te. Será que és feita de ar? Em toda a parte as tuas cores são cores de sítio nenhum. Não és, mas aparentas ser, e isso é tão bom. O mundo é este sítio tão louco, é este sítio tão estranho. Se me perguntassem diria que estamos a sul do paraíso e a norte do inferno. Estamos ali no meio a viver no purgatório. Vamos pagando pelos nossos pecados à medida que os cometemos. Se me perguntassem diria que vivemos para pecar todos os dias. Há tanto amor vadio por aí e tanta gente desesperada por algum amor. Tanta gente a morrer por um pingo de amor e tanta gente a matar-se por amar demasiado. Há demasiadas Julietas e outros tantos Romeus que, algures a meio da peça, decidiram emigrar com a jeitosa que lhes piscava o olho da plateia. O mundo é um sítio demasiado estranho. Às vezes contemplamos o céu na esperança de um milagre, o mais triste é que acabamos por ignorar os milagres que nos rodeiam aqui por baixo. Pecamos por ignorar o que nos rodeia e o pior é que o inferno está mesmo aí à porta. O diabo puxa-nos as pernas a cada segundo que nos distraímos. Se me perguntassem pelos Romeus diria que foram puxados para sul pelo diabo. Os homens foram feitos para viverem depressa. A vida de um homem é um segundo na vida de Deus. Mas não é de Deus e dos homens que te falo, pois não? Falo-te da minha luta: a única que trago e a única que me permito. És a minha luta, sabias? Eu sei que parece absurdo, mas nós que vivemos neste purgatório, neste limbo entre o céu e o inferno, temos a mania de contrariar a vontade de Deus e dos anjos e do diabo. A vontade dos homens é viverem eternos. A vontade dos homens é escaparem à luta dos gigantes. O céu não chora quando um homem morre. O céu não ama os homens. O céu é um gigante azul que olha de cima para nós. O meu sonho é ser para sempre olhado de cima pelo céu. É por isso que luto. Tu és a minha luta, lembras-te? Amar-te é ser feito de ar, e o ar não se esgota. O ar é eterno, não é? Espero que sim. Talvez a minha luta se confunda com a luta dos homens. A única diferença é que eles vivem demasiado depressa para serem eternos enquanto que eu já sou eterno no teu amor.

PedRodrigues

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